sexta-feira, 30 de março de 2018

Ana Vitória Mussi apresenta panorama de sua produção na Galeria Lume


Com curadoria de Adolfo Montejo Navas, mostra reúne cerca de 40 trabalhos da artista, consagrada por explorar a fotografia em diferentes suportes

'Tua imagem', Série Negativos, 1978-2004 - Ana Vitória Mussi
Ana Vitória Mussi faz parte de uma geração de artistas que, na década de 1970, incorporou novas linguagens à arte contemporânea, ampliando os temas e suportes da produção brasileira. Natural de Laguna (SC), iniciou sua carreira no Rio de Janeiro, em plena ditadura militar. Nesse contexto, subverteu os usos tradicionais da fotografia e criou uma obra potente, que questiona tanto a situação política da época, quanto o estatuto da imagem na cultura de massas – tema ainda bastante recorrente em sua produção.

A consistente trajetória de Ana Vitória é celebrada pela exposição Lethe, Mnemosyne (Esquecimento, Memória, em tradução literal), que a Galeria Lume recebe a partir do dia 4 de abril. Com curadoria do poeta e crítico espanhol Adolfo Montejo Navas, a mostra apresenta ao público cerca de 40 trabalhos da artista, entre vídeos, serigrafias e instalações, todos baseados na linguagem fotográfica.

Sua primeira individual em uma galeria paulistana traz um panorama bastante abrangente de sua extensa produção. Pioneira ao investigar a fotografia como um campo ampliado, a artista a enxerga para além do registro documental. Equilibra-se sobre a tênue linha que separa arte e fotografia. Não raro, suas composições partem de imagens subtraídas dos mais diferentes meios. "Ana Vitória constrói uma poética da imagem e estabelece uma ruptura perceptiva, propondo uma mudança sensível e imperecedoura da nossa relação com o imagético", afirma Montejo Navas.

Já em seus primeiros trabalhos, a catarinense realizou uma sucessão de intervenções nos jornais cariocas. Essa fase é representada na exposição por Trajetória do osso - A Rebelião (1968), colagem na qual Ana Vitória desenha sobre fotos de protestos, inserindo nelas ossadas gigantes. A montagem cria a ilusão de que os ossos estão sendo carregados por uma multidão – clara referência ao momento político vivido pelo Brasil às vésperas do AI 5, quando as rebeliões eram asfixiadas. "As mídias passavam por um controle e uma censura absolutos do que podia ser mostrado, incluindo a própria violência que ocorria nos porões de um Estado totalitário", conta a artista.

Na série Barreiras, Ana Vitória também se baseia em periódicos, intervindo com guache em imagens de atletas de modalidades diversas. Parte integrante do conjunto, o trabalho Boxeador (1972) traz o corpo retorcido de um pugilista. Para reconhecer que se trata de uma figura humana, o observador precisa olhar com bastante atenção, movimento constante no reconhecimento de suas obras.

"O que é a sua fotografia nesse momento? Na resposta, não cabe reduzi-la a quaisquer das variantes contemporâneas do registro automático. Essas imagens, nem figurativas, nem abstratas, estão para além da representação", pontua o crítico Paulo Herkenhoff sobre o conjunto, ressaltando o caráter ambíguo dos trabalhos que abarca.
Concebida em 2017, a série inédita Sobremar apresenta um apanhado de fotos do Museu de Arte do Rio (MAR), complexo formado por dois prédios interligados: o Palacete Dom João VI, de estilo eclético do começo do século XX, e o edifício vizinho, fruto de um projeto modernista. Nessas obras, a artista subtrai parte das imagens e insere sobre elas planos e áreas pretas. A série, como grande parte de seu trabalho, dialoga com o movimento neoconcreto, brincando com os conceitos de construção e representação.

"Ana Vitória é autora de uma obra pulsante, que tem perpassado bem os tempos, do início de sua carreira aos dias de hoje. Sua produção segue em sintonia com a atualidade, mantendo-se permanentemente experimental", afirma o curador Montejo Navas.
Na exposição, que segue em cartaz no espaço até 14 de maio, Ana Vitória Mussi também apresenta obras de suportes diversos. A artista insere em suas produções negativos, rolos de filmes e slides – materiais que fazem referência ao passado da artista que, entre 1977 e 1989, trabalhou como fotógrafa de colunas sociais.

Na obra À tua imagem (1978-2004), por exemplo, um rebobinador expele inúmeros negativos de políticos e celebridades, retratados ao longo de seu ofício nos jornais cariocas. De forma irônica, a artista enfatiza a passagem do tempo, que tornou o material obsoleto. Realizadas de modo a eternizar personalidades ilustres, as imagens aqui aparecem como sinal da finitude: não revelados, seus protagonistas desaparecem, amalgamados pela monótona semelhança entre os negativos.

Esse material acumulado também compõe a instalação Lethe, que nomeia a mostra. Nela, a artista une fragmentos de negativos a um fio de náilon, formando uma fita de aproximadamente 4 metros de extensão. Ao lado, cópias fotográficas são dispostas em uma mala de viagem. O tema da memória, e a forma como ela é construída pelo homem, mais uma vez é o centro de suas reflexões. "O título deste trabalho faz alusão ao rio grego Lethe, onde as almas iam se banhar para esquecer vidas passadas", conta a artista.

Sobre a artista
Natural de Laguna (SC), Ana Vitória Mussi estudou arte com Ivan Serpa e fotografia com Kaulino e Ricardo Holanda, no Senac, Rio de Janeiro. De 1979 a 1989, trabalhou como repórter fotográfica em grandes jornais cariocas. Entre 1989 e 1990, estudou serigrafia com Dionísio Del Santo e Evany Cardoso na EAV/Parque Lage. A artista é uma das pioneiras na inserção de fotografias na produção de arte contemporânea, expandindo os limites da técnica para além do papel.

Já apresentou mostras individuais em instituições como a Casa da Imagem (SP), Paço Imperial (RJ) e Oi Futuro (RJ). Também participou de coletivas no Museu de Arte Moderna (RJ), na Fundação Vera Chaves Barcellos (RS), na Funarte (RJ), entre outros. Sua obra integra ainda a coleção Pirelli Masp de Fotografia.

Atualmente, Ana Vitória participa da coletiva Radical Women: Latin American Art, 1960-1985, exposição itinerante que traz as práticas artísticas de mulheres da América Latina em um período chave na história do continente, explorando sua relação com o desenvolvimento da arte contemporânea regional e suas repercussões internacionais. Entre setembro e dezembro de 2017, a mostra esteve em cartaz no Hammer Museum, de Los Angeles (EUA). Em abril deste ano, chega ao Brooklyn Museum, de Nova York (EUA). A exposição encerra sua itinerância na Pinacoteca de São Paulo, onde permanence entre 18 de agosto a 19 de novembro.

Sobre o curador
Adolfo Montejo Navas é poeta, crítico e artista visual. Natural de Madri (ES), mora no Brasil há mais de 25 anos. É autor de obras de referência sobre diversos artistas, como Anna Bella Geiger, Victor Arruda, Regina Silveira, Iberê Camargo, Paulo Bruscky, Mário Carneiro e Ana Vitória Mussi.
Ganhou o Prêmio Mario Pedrosa de Ensaio de arte e cultura contemporânea (F. Joaquim Nabuco, 2009) e XV Prêmio Marc Ferrez de Fotografia - Reflexão crítica (Funarte, 2015). É Notório saber em Artes pela UFRGS, 2016.
Sua última produção são os livros Fotografia & poesia(afinidades eletivas) (Ubu, 2017), Poemas casuais (Medusa, 2017) e Patricio Farias (Iluminuras, 2017) e as exposições individuais Continuum ~ Peças soltas (ESPM, PoA, 2017) e Antologia poética (MON, 2017-2018).

Serviço:
Lethe, Mnemosyne, individual de Ana Vitória MussiLocal: Galeria LumeAbertura: 4 de abril, a partir das 19hPeríodo expositivo: 5 de abril a 14 de maioEndereço: Rua Gumercindo Saraiva, 54 - Jardim Europa, São PauloVisitação: de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h | sábados, das 11h às 15hTelefone: (11) 4883-0351
Informações para a imprensa:
A4&Holofote
Manel Bronx
Manel Bronx

This is a short biography of the post author. Maecenas nec odio et ante tincidunt tempus donec vitae sapien ut libero venenatis faucibus nullam quis ante maecenas nec odio et ante tincidunt tempus donec.

Nenhum comentário:

Postar um comentário